morro frequentemente por ti e não sei
o amor é quando tu me salvas
mesmo que ignores o protocolo
a lágrima quando cai de tardia não lembra a hora em que teve vida
premissa básica
o poema só é poema quando não consegue morrer por outra via
o amor é quando tu me salvas
e o meu sangue que corre ao contrário
como as estações depois de Neruda inventar as andorinhas a primavera as cerejeiras
e a imaginação que perdura
além um exército de ecos urgentes a florir na agitação de um sexo que já não sabemos
algo como um coração a bater debaixo da mesa, ouve-se
coisa indesejada, ouve-se
algo como um coração
preciso de silêncio para reconhecer no teu corpo a fuga
mãos a nascer do nada tocam memórias vazias
mãos a nascer do nada nada tocam como memórias
premissa básica
desacreditar do tempo nas suas mais impenetráveis formas é calar as sombras deste poema
é abraçar-te e
ver as flores sorrirem como quando as escrevi, e depois pensei
chove tanto nos dias que passo sem ti
uma chuva que afoga tudo e não lava nada e não leva a nada
e nada leva a nada
delicado coração de mão estendida para ti num percurso só de ida
súbito percurso de sombras e vozes menstruadas
má notícia, duas vezes má notícia
o poema não se quer amado
já que a vida o esmaga de seguida
e as coincidências que não passam de ressonâncias que se repetem nas ressonâncias de coincidências anteriores
também o levantar-me esta manhã não tem mais propósito que levantar-me esta manhã, repetir nesta a manhã de ontem e
também as palavras não cabem nas palavras mesmo quando ficam escritas
e não posso escrever mais alto e tu não ouves e a Mafalda baixinho:
´poemas sujos são melhores que poemas lavados`
premissa básica
poemas lavados não são poemas
e não posso escrever mais alto
e morro frequentemente por ti e não sei
4 I 2011 Porto
2 comentários:
«Odiava, odiava, odiava o mundo. Odiava e evitava tudo o que existia, se movia e vivia. E então chegaste tu, fresco, tolo, desajeitado, insolente e com o aroma de emoções incorruptas em flor, e eu, como é natural, reagi com violência, mas assim que te vi sabia já que tu eras um esplêndido rapaz, caído do céu, enviado e oferecido, assim me parecia, por um deus omnisciente.»
Robert Walser, "Jakob van Gunten", Relógio d´Água, 2005
Ass: Marco
Lindo!E bem a propósito!
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