31.3.11

From Poets Corner - Xavier

inventar um sono virgem de ti
resposta para o meu coração
por não saber morrer  quando poderia ter morrido


o frio entrou em erupção agora


a pele por debaixo da pele
                                               quem a não tem    a culpa?

revela algo como sangue a expandir-se no ruído que se acumula ao redor dos dedos
expostas costeletas que deixaram de ter céu
                                                                               ou palavra

lentes precisas que permitem perscrutar o segredo mais antigo da morte
que é segredo nenhum
toda a exacta maquinaria assim exposta
eis o terrível mecanismo da vida interior da morte
o amor
é segredo nenhum que se evapora


pulmões fumam-se a si mesmos
no fétido dia oitavo da criação

Porto    18 II 2011

12.3.11

uma breve suspeita de que sempre tive o coração mal situado

uma breve suspeita de que sempre tive o coração mal situado, o início

e a certeza de que só tu conheces a minha geografia,

por isso,

quando te digo volta depressa, quero dizer…volta depressa!

e se não te importares: não suspendas o tempo: não obrigues os pássaros a inventar a respiração: cala as bibliotecas: põe-me em modo de espera…ainda que saibas que eu sei esperar-te, e adormece a noite gentilmente e o dia, e quando vieres traz-me muitas saudades

que quando te digo, volta depressa, quero dizer…volta depressa!...

quero dizer, não vás!

sim, em modo de espera

e sobretudo não me obrigues a inventar o sol na tua ausência, e faz-me esquecer as palavras, não quero dizer saudade, não preciso de dizer saudade, não preciso dar nomes ao que sinto

e já vou esquecendo a idade das palavras,

e restam já poucas para te dizer o que sabes que sinto,

por isso não preciso de dizer saudade, por isso digo apenas cereja, ou manhã, ou cor, ou casa, cereja, manhã, cor, casa, os teus olhos…

— diz antes: o melhor lugar do mundo

— o melhor lugar do mundo

és tu, e vou para dentro agora, deixo ficar caída a toalha, amor, vou para dentro do amor para aprender a dizer-te casa

— vai, mas antes diz: o melhor lugar do mundo

— gosto tanto de ler em ti coisas que não sabes que existem,

és tu

— e hoje o professor perguntou-me se eu estava apaixonada

— e digo: deixa-me ser o teu melhor lugar do mundo

— e hoje o professor perguntou-me se eu estava apaixonada

— e na terça-feira apeteceu-me que me pedisses para acordar contigo, por isso acho que o teu professor tem razão

agora vou para dentro do amor, amor, vem

assim ficas a saber que eu estive sempre aqui.

1.3.11

Poetry Rules - Henrique Manuel Bento Fialho

Se eu te amasse a horas certas,
abririas as pernas com menos cuidado?
Se eu começasse sempre pela língua,
julgar-me-ias menos bruto?
E se eu não te mordesse o pescoço,
acaso continuarias a cravar-me as unhas nas costas?
Se eu não apagasse a televisão. adormecerias aconchegada à minha cintura?
Se eu tomasse banho depois de fornicarmos,
julgarias o acto mais higiénico?
Se em vez do silêncio depois do orgasmo
passássemos a ter uma confissão no olhar,
perdoar-nos-ia deus o desperdício?
Já agora diz-me: se não dependêssemos
um do outro, como é que explicarias
o teu cheiro nas minhas palavras?